fanzine Tertuliando (On-line)

Este "blog" é a versão "on-line" da fanzine "Tertuliando", publicada pela Casa Comum das Tertúlias. Aqui serão publicados: artigos de opinião, as conclusões/reflexões das nossas actividades: tertúlias, exposições, concertos, declamação de poesia, comunidades de leitores, cursos livres, apresentação de livros, de revistas, de fanzines... Fundador e Director: Luís Norberto Lourenço. Local: Castelo Branco. Desde 5 de Outubro de 2005. ISSN: 1646-7922 (versão impressa)

segunda-feira, maio 16, 2005

A Cultura em Castelo Branco

Há alturas em que negar uma palavra amiga é tão grave como ficar calado perante as injustiças.
Desenvolvendo a Cultura também se cumpre Abril.
A Cultura em Castelo Branco deu um salto qualitativo e quantitativo sem precedentes nos últimos cinco anos, sobretudo nos últimos dois.
Para isso contribuíram: a criação da revista mensal “Raia” (que faz quatro anos em Setembro); a criação pela “Alma Azul” da revista mensal “Alcains 2000”; a abertura da Livraria “A Mar Arte” (por toda a actividade da mesma que vai muito para alem da simples venda de livros, o que por si só já era importante); as iniciativas (lançamento e apresentação de livros e recitais de poesia) da “Alma Azul” – que abriu uma delegação em Castelo Branco – como o Encontro de Poesia Alma Azul; os Ciclos de Teatro do Instituto Politécnico de Castelo Branco (IPCB); os Ciclos do IPCB; a Cultura Politécnica, da responsabilidade do IPCB; os Ciclos de Teatro para a Infância e a Juventude (realizou-se o II este ano) organizado pela Delegação Regional [de Castelo Branco] do Instituto Português da Juventude (IPJ) e pelo “Váatão”; os concertos no Centro de Estudo para as Artes – Belgais – os quais têm entrada livre e a cujo acesso é garantido transporte gratuito pela Câmara Municipal de Castelo Branco; a reabertura (15 anos depois!) do Cine-Teatro Avenida – faz em Setembro um ano – e todas as iniciativas aí realizadas e a criação da Agenda Cultural do mesmo; a “Primavera Musical”, organizada pelo Conservatório Regional de Castelo Branco e que realizara em Maio o VII Festival Internacional de Música de Castelo Branco; a criação da Escola Superior de Artes Aplicadas (ESART) do IPCB e, por esta, da Orquestra de Câmara da ESART; a criação do Museu de Tapeçaria do IPCB; a realização das duas (extraordinárias) edições (que devem repetir-se) do “Raia sem Fronteiras. Festival de Cultura”; a abertura da Casa do Arco do Bispo; as iniciativas de índole cultural da Delegação Regional do IPJ; a reabertura – depois de estar vários anos encerrado para obras – do Museu Francisco Tavares Proença Júnior e tudo o que este tem promovido, desde a possibilidade de consultada sua biblioteca, às exposições, aos cursos de bordados, às conferências e aos ateliês; a criação do grupo de teatro albicastrense “Váatão”; a criação da Evasão – Ateliê de Artes; as exposições no Museu de Arte Sacra da Misericórdia de Castelo Branco, na Galeria Manuela Cruz, na Galeria Rural Arte, na Galeria Bar Património, no Hotel Meliá Confort Colina do Castelo, na Casa do Arco do Bispo, na Sala da Nora no Cine-Teatro Avenida e no Arquivo Distrital de Castelo Branco; a disponibilização aos leitores albicastrenses de mais de 10000 livros (doados pelo ex-Governador Civil, Dr. Vasco Silva ao PCP), cedido pelo PCP à Biblioteca da ESE do IPCB; a instalação na cidade de uma Delegação Regional da RTP, donde é emitido o programa “Regiões/Castelo Branco”, importando, no que à divulgação das actividades culturais na Beira Interior diz respeito; a abertura da Delegação Regional do IPPAR (Instituto Português do Património Arquitectónico) e, por último, Castelo Branco é desde o fim do ano que passou Pólo de Excelência Cultural, sendo o único concelho da Beira Interior a integrar este programa do Ministério da Cultura e uma das dez cidades que o integram.
Estes serão, se quiserem… filhos da Utopia que já nasceram.
A nova Biblioteca Municipal de Castelo Branco, o novo Arquivo Histórico Municipal de Castelo Branco, a elaboração duma Agenda Cultural – mensal, que a cidade já começa a exigir – do Concelho de Castelo Branco e a reabertura do Museu Académico.
Estes serão os filhos da Utopia esperados brevemente.
Não tenho memória de, em tão curto espaço de tempo, ter assistido a tantas peças de teatro, a tantos recitais de poesia, concertos de música, lançamentos e apresentações de livros como nos últimos meses em Castelo Branco.
Só com esta verdadeira revolução cultural pode Castelo Branco vir a contar com uma verdadeira consciência crítica.
Agora, meus amigos ter oferta cultural é uma coisa e saber e querer aproveitá-la é outra.
Esta é uma cidade muito estranha… antes queixavam-se as pessoas de que não acontecia nada, agora que acontece… aderem muito pouco.
No entanto, a Cultura está no bom caminho em Castelo Branco, para admiração de alguns e inveja de outros.

Luís Norberto Lourenço

Nota:
1) Publicado no “Reconquista”, em 25/5/2001.

2) Este texto obteve, no sábado seguinte, uma reacção no programa “Indústriad’arte” da Rádio Beira Interior, aplaudindo o artigo de opinião mas dando “o toque” à ausência duma referência ao programa. O autor destas linhas, que se encontrava a ouvir o programa, telefonou para a RBI e aceitou o reparo.

3) Como estamos quatro anos depois? Num blog perto de si poderá ler uma reflexão actualizada.

quinta-feira, maio 12, 2005

Amor, ódio e racismo

Este texto, anima-o a denúncia do racismo e da xenofobia, como contributo para a revolução das mentalidades das gentes da Beira Interior.
O racismo que existe na nossa região tem a faceta mais perigosa, porque tem a cobri-lo uma grande, mas no entanto frágil, máscara. Não é tanto o racismo violento – de que são exemplos agressões e mortes, motivadas pelos preconceitos raciais –, não é o racismo visível que me preocupa mais na Beira Interior, porque esse, por se mostrar, pode ser combatido mais facilmente, porque está identificado, pior é o que está interiorizado na mente das pessoas, é o racismo invisível, difícil de combater, porque apenas se insinua no privado e aí age, não se manifestando publicamente.
É o racismo do foro psicológico, que se sente, nomeadamente no seio familiar, quando se ultrapassam as barreiras do preconceito e dois jovens (ou não) com diferentes tons de pele se tornam amigos, “pior”, se se apaixonam, mas se falam em casamento, então a casa vem abaixo; é a ameaça da expulsão da casa dos pais e a ameaça de o (a) deserdar; é o dizer «para mim morreste, já não és meu (minha) filho (filha)»; ou mesmo a violência física e, por fim, a traição dos falsos amigos.
E não se pense, que falo de abstracto, falo do concreto, estou a pensar em casos que conheço e em que as vítimas deste racismo mo denunciaram. Neste caso específico, do racismo que atinge o seio de uma família, o caso é tanto mais grave, quanto mais cultos são os progenitores, porque a cultura e a educação de que são portadores os devia tornar menos permeáveis aos preconceitos raciais. E quando falo em progenitores cultos, estou a pensar em dois grupos profissionais concretos, o dos profissionais ligados ao mundo das leis: advogados e juízes.
Assim, diria mesmo que é altamente preocupante, se um desses pais racistas é professor (a) – imagine-se que mensagem passará nas aulas, talvez a da “superioridade” da sua “raça”, da sua religião? – ou juiz (a) – tendo à sua frente litigantes de “raças” diferentes, poderá ser imparcial? – ou, finalmente, advogado (a) – que escondendo os seus preconceitos raciais se apresta a defender uma pessoa de outra “raça”, não para ajudar a resolver o seu caso, mas para prejudicá-la.
É a mesma gente, dita “muito católica”, mas pouco cristã, dita “de bem”, defensora da moral e dos bons costumes e apregoadora do Amor contra o Ódio, que com o seu ódio racista destrói o amor de dois jovens, apenas e só, porque as suas cores de pele são diferentes.
Algo, que para quem não é racista é apenas aparência – não o essencial –, a cor, a qual não é portadora de cultura, de personalidade, de carácter, de valores, é apenas e só uma cor, um tom de pele, de olhos, de cabelo… enfim, do que se quiser.
O racismo de que falo não é minoritário na Beira Interior. Não, já perdi a ilusão, é maioritário. Só que, quem é portador da doença do racismo, tem vergonha, e assim é difícil combatê-la, e essa é a tarefa mais árdua de um anti-racista. Adivinho as reacções a este texto e não as temo, porque sei que – se o ódio não vos cegar – ao tocar no vosso ponto fraco, meditareis sobre ele, e então, talvez tenha valido o esforço.
A verdade vencerá o ódio e a vergonha apoderar-se-á de vós, se se revirem nestas palavras.
E então, quiçá, algo mude.

Luís Norberto Lourenço

P.S.
Artigo publicado no “Jornal do Fundão”, 23/1/1998.
Hoje, não o escreveria assim, não tanto pelo conteúdo (se bem que entre as duas datas ocorreu um homicídio, no Fundão, por motivos racistas e soube-se, em Belmonte, de casos de escravatura, em que "senhores" e "escravos" não são da mesma "raça"), mais pela clareza da mensagem.