fanzine Tertuliando (On-line)

Este "blog" é a versão "on-line" da fanzine "Tertuliando", publicada pela Casa Comum das Tertúlias. Aqui serão publicados: artigos de opinião, as conclusões/reflexões das nossas actividades: tertúlias, exposições, concertos, declamação de poesia, comunidades de leitores, cursos livres, apresentação de livros, de revistas, de fanzines... Fundador e Director: Luís Norberto Lourenço. Local: Castelo Branco. Desde 5 de Outubro de 2005. ISSN: 1646-7922 (versão impressa)

quinta-feira, abril 17, 2008

TALVEZ

Como falar sobre a memória recente relativamente a acontecimentos traumáticos? Esta é sem dúvida uma das tarefas a que os investigadores portugueses, historiadores e outros cientistas sociais como antropólogos e sociólogos se propuseram nos últimos anos a estudar através de exemplos de outros investigadores quer europeus e americanos.
A história contemporânea tem vindo a apropriar-se da memória documental isto é fotografias, documentários filmícos ou noutros casos através de entrevistas com pessoas que directa ou indirectamente fizeram parte do decurso da história recente. Estado Novo, 25 de Abril, etc. Estes assuntos têm vindo a ser debatidos nas universidades portuguesas nos Institutos de Etnologia e História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas.
Lembrei-me de dois casos por serem mediáticos e terem recebido prémios e terem tido honras de recensões em revistas e jornais, nalguns casos os seus autores deram até entrevistas. Aconteceu com Irene Flunser Pimentel, acerca da publicação de uma obra a partir da sua tese de doutoramento (“A História da PIDE”, Temas e Debates) que recebeu o Prémio Pessoa o ano passado, e Paula Borges Santos (“Igreja Católica, Estado e Sociedade -1968-1975, Eds. ICS) que foi distinguida com o Prémio Fundação Mário Soares 2004.
Por debaterem o assunto com que iniciei esta crónica, foi nelas que caiu a minha escolha.
Se por um lado, uma das teses causa revolta, vergonha e nos questionamos como foi possível todo aquele mecanismo?
A outra faz uma reflexão sobre as ligações entre a Igreja e o Estado no ocaso do Estado e no início de uma nova era que a algumas pessoas olham nostalgicamente pois foi vista, nos primeiros dias como um verdadeiro conto de fadas onde os verdadeiros vilões são castigados. Outros verão como o fim de uma época e uma verdadeira dor de cabeça.
Para Irene Pimentel estudar a história da PIDE não implica perdoar, parafraseando um outro autor que cita na introdução. Quem quiser saber poderá ler o livro... só terá que se dirigir a uma biblioteca, ou uma livraria... "Compreender não é perdoar. Estes homens são seres humanos e não monstros, obedecem a ordens". Quem não leu já o romance “As Benevolentes”? Um megaromance em que a personagem central aborda o mesmo nas primeiras páginas, narra aquilo que se fazia antes da guerra, cuja acção foi atribuída às SS. Uma enigmática estrutura nazi. Talvez por isso seja necessário falar de dois acontecimentos passados recentemente.
O seminário Internacional sobre a Memória, organizado pela Fundação Mário Soares e pelo Instituto de História Contemporânea, onde historiadores, antropólogos, museólogos, advogados e outras personalidades presentes puderam debater estes e outros assuntos.
O segundo caso de que vos gostaria de falar é uma exposição patente no CCB sobre a emigração, Intitula-se "Por uma vida melhor " de Gérald Bouncord.
Visitá-la é ver uma outra realidade que a maioria das pessoas não conhece: a dos emigrantes clandestinos que procuram melhores condições ou que fogem de perseguições políticas.
Este senhor de 81 anos confessou-me num curto momento daquilo que viu e viveu nos bairros de lata feitos pelos emigrantes portugueses e da forma como ele foi tratado pela polícia política de então, a tal PIDE.
No momento da inauguração podemos não só observar os rostos daqueles que se deixaram fotografar para a posteridade. A sua cultura, a vida que trouxeram está toda nas fotos estampada no exercício de esperança de um dia terem uma vida melhor.
Ali estavam as galinhas, as barracas faziam lembrar as construções de algumas aldeias de Portugal. O interessante é na opinião de algumas pessoas podermos ver aquilo que muitos hoje continuam a não querer ver. Afinal não está na hora de mudar um pouco os temas da história contemporânea?
Não haverão outras pessoas para estudar sem ser o Senhor Presidente do Conselho?
Às vezes a memória das pessoas é muito quando olhamos o nosso presente e achamos que encontramos conforto numa época passada que rapidamente esquecemos de quão desconfortável foi. Memória curta…
Ah... e também a das imagens...! Como costuma dizer o povo... para que a memória não cesse... uma imagem vale mais que mil palavras.
Talvez por tudo isto e muito mais agarre no seu carrinho num destes fins-de-semana e largue o centro comercial onde costuma passear em fato de treino com a sua esposa e as crianças, e leve um verdadeiro murro no estômago com toda a violência a que o Restwling já vos habitou, não há ringues, nem meninas a passear a mostrar os pontos de cada rival, nem caras partidas.
Pense que a exposição irá durar pouco mais de três ou quatro meses. Porque como dizia há pouco há imagens que valem mais que mil palavras.
Talvez... como diria o outro... e como anuncia um rádio portuguesa com certeza... talvez... fazer um dueto com ele (o Pedro Abrunhosa). Talvez... Por um futuro Melhor!


António Almeida

Lisboa 25 de Fevereiro de 2008